A práxis do governo parece querer transformar em categoria de pensamento o mal feito. E isto se dá, com efeito, em todas as estruturas de Estado. Tangencia-se princípios sem se dar conta do poço de infortúnios que delega a gerações futuras. Há, sem sombra de dúvida, priorização de interesses privados, às vezes corporativos e imediatos, contrariando a função primordial do poder público. E, pior, não há qualquer resistência sistematizada a decisões arbitrárias e eivadas de vícios.
Este, talvez, um dos efeitos da hegemonia política forjada nos últimos anos no Tocantins, financiada com recursos públicos, que, no limite, provoca a derrocada da democracia com seus próprios instrumentos que, a priori, deveriam aperfeiçoá-la. Ninguém, em condições normais, é contra qualquer governo. Afinal, as pessoas esperam que os administradores cumpram o que prometeram em troca do mandato.
Seria por demais contraditório (e contraproducente) torcer para que um governo não dê certo, não é
verdade! O fracasso de uma administração causa desdobramentos na economia. Se
atinge a mesa e o intelecto do cidadão o que se dirá de outros setores? Por
isso têm que dar certo.
Daí que, no estado democrático (e especialmente nos Estados,
como no Brasil, onde o poder público ainda é muito presente) qualquer ação ou
omissão tem resultados a curto e médio
prazos. Para o bem ou para o mal. Por isso, a necessidade de fiscalização das
ações dos agentes públicos, o que não ocorre nas hegemonias políticas, caldo de
cultura onde germina governos despóticos.
Isto, certamente, é uma das explicações que se pode deduzir do trenzinho da alegria implantado pelo
Palácio Araguaia na Fundação Unitins no mês de agosto último, em plena campanha
eleitoral, por Medida Provisória, que a Assembléia aprovou sem qualquer
constrangimento. Mesmo diante da movimentação dos servidores da instituição
que, desde o ano passado, cobravam maior debate sobre a tal Medida Provisória.
Não sem razões objetivas.
Transformada por suas excelências, sem qualquer discussão, na Lei 2.892, de 19 de
agosto último, com a finalidade de instituir o Plano de Carreiras e Salários da
Unitins, o monstrengo abre, de forma transversal, a possibilidade para uma transição de
professores e servidores da educação básica como pertencentes ao quadro efetivo
da Unitins. Ou seja, professores da educação básica da Secretaria de Educação
que, por anos, acumularam empregos nas duas instituições, poderão, agora, ser
enquadrados no Plano de Cargos da Unitins. Concurso? Validação? Ora, pra quê? Titulos
acadêmicos, nem pensar, estamos bem, temos a melhor educação do país, não é
verdade?
A Lei, no fundo, assemelha-se a um Cavalo de Tróia para a
academia. Grosso modo mantém a disposição dos governos que passaram pelo
Palácio Araguaia de fazer da Unitins a sua Geni desde que foi utilizada como
mãe de aluguel da Universidade Federal do Tocantins. Dá a impressão de ter sido
talhada para atender interesses políticos e corporativos. Uma leitura dos
artigos 2 e 32 do dispositivo não deixa margem para dúvida:
tá lá a casca de banana.
Obviamente, a questão é incontroversa. Ainda mais na Unitins
que passou por um processo de descredenciamento, não faz muito, do Ministério
da Educação, por irregularidades com a Eadcon, com a parceria alimentando
desconfiança de que o sistema estaria, na verdade, funcionando com uma
lavanderia de dinheiro sem lastro. Imagina, uma instituição universitária
pública preenchendo seu plano de cargos com servidores sem concurso público.
A questão foi até
mesmo suscitada pelo Tribunal de Contas, no final do ano passado, quando
questionou o concurso público para professores, mestres e doutores (cujo
processo está em curso na instituição). O TCE barrou o concurso, na época, por
ter, dentre outras, dúvida sobre o número de servidores efetivos da Unitins. Para
o TCE não estava claro quantos servidores efetivos tinha a Fundação Unitins.
E
aí os deputados, como que para suprir essa falta, aprovam o estrambolho possibilitando que todos sejam
enquadrados como efetivos. Sem concurso público.
Apenas por ali prestarem serviço. E
olha que a Medida Provisória passou pelo crivo dos parlamentares, de oposição e situação.... Mas lá não se viu qualquer debate público sobre o
assunto. Como de resto virou rotina, apenas endossam, na maioria construida pelo governo, os projetos do Executivos,
mesmo os mandrakianos como esse aí.
Pois é. Isto está
valendo. Sem qualquer questionamento, tanto da academia, dos universitários,
como do Ministério Público Estadual ou Ministério da Educação. Ou seja, no
Tocantins tudo pode. Basta os deputados aprovarem.Nunca é demais lembrar que a
taxa de analfabetismo no Tocantins é de 13,1% (2010). E destes, 11,7% estão
localizados na faixa de 25 a 59 anos. Tampouco relembrar a participação dos alunos da
Unitins nos Exames Nacionais de
Desempenho. Algo, pelo visto, construído pelos próprios burocratas com o
auxílio indispensável dos parlamentares. Situação, certamente, conveniente aos governos e grupos políticos. Afinal, a educação é a mola que muda o mundo justamente porque disponibiliza condições para que se discuta ações tais e a elas se organize resistência sistêmica. Então, que se dê pão e circo.