A presidente da Fundação Cultural, Kátia Rocha, também Secretária de Cultura, sentiu o cheiro de queimado no ar e, diante da possibilidade real de uma vassourada em todo o seu trabalho do órgão, como já recrudescia o ritmo de denúncias (algumas motivadas mais pelo clima colocado que pelos fatos concretos) decidiu ressarcir os cofres públicos com o valor corrigido do show pago no ano passado naquela pousada da família do presidente do Tribunal de Contas: devolveu R$ 2.604,67, conforme o comprovante de depósito publicado na tarde desta quarta, pelo Portal CT, do jornalista Cléber Toledo.
O curioso é que a devolução ocorre menos de 24 horas depois do secretário de Relações Institucionais, Eduardo Siqueira, informar, peremptoriamente, pelo twitter e repercutido nos portais, que Kátia Rocha o devolveria, por considerar, ele Eduardo, que o desembolso com o show não era "moral". Ora, o contrato foi publicado no Diário Oficial em julho do ano passado e, pelo que se vê, só agora foi considerado imoral, ainda que ao agente público seja necessário observar o que vai pelo DO diariamente, têm assessores contratados justamente para isto.
Ou seja, Kátia Rocha, na avaliação do Secretário mais forte politicamente do governo, teria praticado um ato imoral. Politica e administrativamente, qualquer entendido das movimentações políticas sabe muito bem o que isto significa publicamente colocado.
Ao informar ao distinto público no microblog que o governo (onde Kátia Rocha está alojada) não autorizaria tal despesa (autorizada por Kátia, veja, há quase um ano, julho do ano passado) e que, ainda que fosse legal, o patrocinio não seria moral, expõe uma equação não muito fácil do Governador, o legítimo eleito para tal, encontrar o dividendo: ou demite a Secretária por cometer um ato imoral já que não se imagina continuar no governo um auxiliar que pratica atos imorais. E aí daria endosso à confissão do Secretário.
Ou demite o Secretário que admitiu em seu nome, uma possível imoralidade, que ele, Governador, até então talvez não tivesse notado, o que poderia incorrer em responsabilização.E ainda, fazendo as vezes de Chefe do Executivo sem que aguardasse deste último, uma decisão encaixada em suas prerrogativas intransferíveis do ponto de vista administrativo. E emerge outra indagação: Kátia Rocha - que acompanhou Siqueira Campos durante os tempos duros de sem-mandato, no lugar onde o PMDB o deixou - estaria desrespeitando aquele decreto do Governo, do ano passado, de que toda despesa teria que passar, necessariamente, pelo Gabinete do Governador, de quem é fiel seguidora?
Deixando de lado juizos de valor sobre as declarações dos dois secretários (cujos teores enfrentam resistências e críticas de ambos os lados) e sobre os fatos colocados (neste e em outros atritos internos percebidos), politicamente está claro que o governo parece bater cabeça tanto que não consegue chegar a um consenso sobre um caso tão simples e que, fossem outros os motivos (e quem sabe diferentes personagens), encontraria entendimento, senão pelo conteúdo, pelo menos quanto à forma de defesa do governo.
Se não consegue isto, ainda que se considere os fatos, não se foge do raciocínio de que a questão projeta muita coisa, inclusive, disputa de espaço, entre os setores que divergem, assim colocada, nem que para tanto, mesmo sob o ponto de vista legal e moral, exponha-se a administração, no que termina-se fazendo dos erros de uns, a alavanca de Arquimedes de outros, na exata medida de que o vácuo não fica sem ser preenchido por muito tempo. Ganha a figura de Estado (no que é bom para a população), na assepsia, transparência de condutas e pertinência de avaliações, como é claro, mas seguramente perde o Governo e seus agentes públicos e políticos, na perspectiva de que ao expor os problemas do tipo, a partir de uma moral individualizada, ter-se-ia estancado a sangria. E não estariam, de outro modo, também expondo politicamente os que para eles colaboraram, mesmo de forma indireta.