Reproduzi ontem trecho da carta de Padre Vieira a
Dom João IV, no século XVII. Nela o jesuíta relatava que
no Brasil Está-se roubando em todos os modos e
tempos:no indicativo, imperativo, mandativo,optativo, conjuntivo, potencial,
permissivo e infinitivo. Não lhes escapam os imperfeitos, perfeitos,
plusquam perfeitos e quaisquer outros, porque furtam, furtaram, furtavam,
furtariam e haveriam de furtar mais e houvesse.
Pois é.
Padre Vieira está mais atual que nunca e o seu Sermão do Bom Ladrão enquadra,
como louvor, nossos dias, quando se observa, séculos depois, a mesma
dificuldade estoica de se refrear e regular afetos. Isto no sentido de vontade. Senão como não
colocar justaposto, ao que se hoje observa, trecho do Sermão do Bom Ladrão de
1.655?: O brasileiro que atravessar a fase atual terá que
testemunhar à descendência, com as cãs envergonhadas, uma longa página de
amargura e vilipêndio, onde os olhos de nossos filhos buscarão um ponto de
refrigério em que espaireçam (....) Um governo lição viva de todas as
corrupções; (...)O executivo dissipando, transigindo, contrariando encargos
públicos, sem autorização orçamentária; (...)A voragem de deficit a escancarar de dia em dia um
sorvedouro capaz de tragar dentro em pouco a nossa receita total; (...)A
falência do estado prevista, receada, talvez iminente como um traço
terrivelmente negro no horizonte
Isto aí, repito, em
1.655!!!!!
Hoje, circunscrevendo ao Tocantins, no século XXI, essa roubalheira dos governos e
das pessoas nele instaladas, beira a raia do absurdo. É o caso do assunto do
dia: a descoberta de desvios da ordem de R$ 45 milhões da Fundação Nacional de
Saúde. Pelo que vai nos jornais e portais, parece um esquema cruzado.
Dirigentes da Funasa e empreiteiros do Estado atuando lá no Amapá. O contrário,
certamente, será verdadeiro, pelo método: dirigente do Amapá atuando por aqui.
É a lógica que se tem como método. Pela Polícia, se estende por cinco Estados.
No Tocantins, pela
sequência racional, tangenciando a questão criminal, no âmbito político, joga-se o deputado federal Junior
Coimbra, presidente regional do PMDB, no caldeirão. O que adiciona mais um problema ao parlamentar,já às voltas com as defesas daquelas contratações na Assembléia que beiram os R$ 10 milhões, com pareceres contrários no TCE. Em tese, não deveria ser
assim, ninguém é responsável, até prova em contrário, por atos de outrem ainda que o Sermão do Bom
Ladrão, de Padre Vieira ensine que aquele que tem obrigação de impedir que se
furte, se o não impediu, fica obrigado a restituir o que se furtou.
Mas os fatos teimam em resistir e se mostrar como, até certo ponto, verossímeis. Ora, o agora
ex-superintendente da Funasa no Estado, Onofre Marques (afastado pela Policia
Federal), foi indicado ao cargo justamente pelo deputado federal Junior
Coimbra, presidente regional do PMDB. Isto é fato. Onofre foi nomeado a um cargo federal a despeito das
acusações de problemas no Itertins, onde fora colocado pelo
deputado estadual José Augusto Pugliesi, no governo de Carlos Gaguim. Todos do
PMDB.
Ou seja, o escândalo do dia atinge sim o PMDB, mesmo que uma das alas (a
de Marcelo Miranda) seja oposição ao grupo. Esse mesmo pessoal aí enfrentou
acusações de fazer desapropriações ilegais com recursos do governo federal.
Saia-se por aí a encontrar terras baratas e desapropriava-se a preços de ouro.
Isto quando não desapropriava terras já tituladas e titulava-se em nome de
aliados políticos, como foi o caso de uma propriedade em Goiatins, processo
anulado pela Justiça.
Mesmo diante disso tudo,
Onofre foi indicado por Junior Coimbra para o cargo. E o governo federal o
nomeou, a despeito disso. É bem verdade que não há condenação a Onofre, mas os
casos são escandalosos. E eles foram praticados no governo do PMDB.
Para se ter uma ideia do que isto significa, Onofre Marques, sob a presidência da Funasa, tinha como uma das responsabilidades, por exemplo, contratar obras do PAC, de competência do órgão no Tocantins. Somente este ano, a primeira e segundas etapas de seleção de proposta do PAC 2 envolviam recursos da ordem de R$ 87 milhões em 26 municípios. No último dia 3 de outubro, o então superintendente da Funasa, Onofre Marques, através do Memorando 275 GAB/Suest/TO, encaminhava, entretanto, uma lista complementar de seleção de sete municípios (Arraias, Babaçulândia, Carmolândia, Conceição, Pedro Afonso, Pequizeiro e Goianorte) no valor de R$ 36,2 milhões. Todos aí municípios da base eleitoral de Junior Coimbra, o que provocou reações contrárias dos outros parlamentares.
O escândalo da Funasa, ainda em investigação, atinge sim, de cheio o PMDB. Especialmente aquela comandado por Junior Coimbra tido como aliado do Palácio Araguaia, algo que o parlamentar tem negado publicamente, apesar de nos bastidores a movimentação tenha sido entendida com vetor inverso. No que, certamente, pode representar uma pedra a mais no calcanhar de Junior Coimbra e Carlos Gaguim para manter a hegemonia do partido no Estado.